domingo, 23 de dezembro de 2012

Via sacra


A mão desce a alcinha para um outro ângulo
curativo no dedão
e um olho esbugalhado

Ana pra baixo
Regina dirigindo

Um negro na rua
trajando
parte de uma farda camuflada

Na terceira marcha
o para-brisa desperta
e o vidro chuvisca

Passa em sépia:
uma praça defumada
chafariz magro
bancos morgados de sono

O cheiro da foda vazando
indo pra sarjeta
o cara no chão
o carro em fatias

Regina maquiagem
Ana mascarada
e o negro sabotado
vão se decompondo
cada qual em seu canto

Os três em alarido
com defeito de fabrica
num teste drive

tudo fechado
tudo fechado
tudo fechado

Amanhã eles trabalham
pegam cedo

Regina dentista
Ana vendedora
o Negro frentista


Tela: Ernest Descals

IN








quinta-feira, 29 de novembro de 2012

O lixeiro

Vibratos
 de
  um olho-chumbo

Tem café vivo no copo
 onda de borra
  vala
   cheiro forte
 
do globo
 ao desuso

“a turbulência”

Sob luzes
e
ruídos 

"o resíduo"

No corpo
 o anjo degradado

Na lida
 entre restos e
ratos
   aquele
é
aquilo

Carlos da Silva Prado


sábado, 17 de novembro de 2012

Crônicarioca


Um sebo estirado na calçada
e do outro lado da rua
um amigo com o paletó do avesso
atingido pelo gotejo do ar-condicionado   

O atendente é um indiano
desconexo
olhos entornados de pretume
na espera das anfíbias do Arpoador 

Pelo sangue de Hermes!
Duas notas de vinte
para o garoto fazer um corre

Só as três
acontece o desmoronamento
da inutilidade naquele cruzamento
O indiano acaba vendendo três novelas
rebuscadas de pinceladinhas curtas
com o gosto cínico das bailarinas de Degas

Em cada paragrafo da cidade
mulheres e moços de azulejos desfilam
funcionam
mas preferem refresco

As pessoas e os livros
naquela capital
trafegam
resguardando certa sanidade
A inerente vontade de comer areia em público
seria um risco 

Aquele mar tem gosto de geladeira
não tem enguias
não tem lugar
não tem Bandeira

pic. Dani Ribeiro

sábado, 20 de outubro de 2012

Rasura


O princípio ativo
do verso
é o dorso

Entre palavras e víboras
existe
1+1=3793signos

descrevo
ou descrença?

Qual é o pico desse vício?
qual é
a fome disso?



quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Cosmopolita

As presas

A vida tem sua gênese cravada na carne e na fome
Valido de pequenos ornamentos que rasgam e trituram

“o homem é mandíbula”

Essas pequenas estruturas de cálcio
amarelam-se com café
bambeiam-se com o tempo
apodrecem com o açúcar
. . . 

“se cuide”

A filosofia não lhe servirá em coisa alguma
se você não possuir no mínimo uma dentadura
. . .

A outra

São infinitas...
A multiplicação das faces aconteceu

é um milagre!

“somos um tipo semelhante”

Graves fermentadas ossudas sintéticas oleosas vermelhas
encardidas secas queimadas puras inchadas raquíticas fartas enrugadas

Elas brotam e secam como folhas
e seu viço dura aproximadamente meio século
. . .

O cheiro

Em todos os graus e ângulos
(a)simétricos
Italianos turcos africanos
desalinhados abertos enormes pontudos 
amassados finos pequenos rechonchudos esculpidos

Há narizes espalhados por todo o mundo
perambulando solitários entre ácaros coca perfumes e CO2
. . .

Sortilégio 132

Oh Zéfiro
Ok Tupam e Ogum!
“vós” nos misturastes
no copo
saturando e esvaziando
num respiro profundo e na asma quimérica

Sua prole delirante
compassada no metrônomo ansiolítico
matéria oca do escárnio do amor e do vício
ainda padece do elemento originário
“a vida”

A mão futurista
(pic. Lucas FL.)

segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Violação

I

Sua gengiva nos primeiros passos...
Não não,
não vai por aí!


a barriga da mãe novamente vazia

A avó
em cabelos
vestindo magreza e ternura
observa distraída
o céu cor de hepatite

“talvez”
. . .

O engraxate
e seu rádio
“PEM    pam
                    m
                       mm
        Tammm

tum run run
   Pííínnn                  
                   ran nn
                             pí
                                í
                                 íínnnnn”

...ei ei
me falta um real para completar minha passagem


malas subindo
malas viajando
pessoas sendo carregadas

oi oi
me paga um salgado...

senhor senhor espere...

posso ler sua mão?

Me desculpe


Prefiro janela
ou
corredor

. . .

II


Em meio a  rebelião óptica 
“eis a ninfeta copo pequeno”

isso sim me tira do sério

cheiro forte
exibicionismo
vagina de gilete
valendo apenas uma passagem de ida

Atenção passageiros
"ônibus 

destino ao rouco espasmo capital"

Virei um mochileiro destemido
viagens à ar condicionado

Me dá um abraço aqui,
e boa aventura meu filho!


III

Ele dissera uma vez que não iria longe
que não daria em nada

por sorte
caíra na real
e voltara para enganar a si mesmo

perdera a paciência com frases do tipo

Eu posso me virar

não podia
ele era um objeto saturado  de acidentalismo
e ela
um “circo(ciclo)” menstrual

pic. Lucas FL.

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

1º equivoco


O tempo seco
“cuidado
qualquer inflamação na garganta pode te levar a óbito”

Mas fique calmo
consulte seu plano de saúde

A cidade
um deserto
respiração
poeira

Quem passa pela praça
escuta apenas ciganas rogando pragas

“as mãos estão todas iguais”

No termômetro
38º

2º Equivoco


A pipoca jogada ou acidentalmente perdida
é disputada num lance de dados por pombos 
e por seres cinzas enrolados em cobertores.
Esses por sua vez
evitam o mínimo movimento durante as noites,
qualquer gasto de gordura pode ser fatal
...
O SENSACIONAL de ontem
encontra-se nas mãos de um barbudo sensato

papel vagabundo
traçando o exagero
e a extravagancia

logo a frente
motoristas que passam por uma moto sem a roda da frente
riem do poste sacana

muletas pra quem te quer!

3º Equivoco


Eu sei...
é mais uma impressão óbvia
mais uma chateação escrita

mas

é nesses pedaços providos de domingos mal dormidos
que percebo qual é o tipo da força humana

Presumo que...
essa força
é a mesma do capim gordura sob o sol
praga invasora de terrenos baldios
que não se resolve com poda
ou guilhotina

Você envelhece e morre
e a humanidade insiste no erro
sufocando flores silvestres
e abrigando em sua vegetação rasteira
um mundo de carrapatos



pic. Lucas FL.


sábado, 25 de agosto de 2012

Viço


Posso lhe chamar de Lourdes, a doida trans de uma década, e ao meio-dia poder arquitetar sua boca em outra argila? Se você me rejeitar ou se aproximar o bastante, esqueça apenas a ideia de banalidade num dos vãos do seu corpo, o místico residirá aí. Depois que selarmos o nosso acordo, usarei um tapa-olho do tipo pirata. Nas madrugadas que seguirem, ordenarei ao bicho de ossos, meu servo, que lhe maquie. Vou aproveitar esse momento para dormir no sereno, quero manter bem fértil as cenas passadas da sua pomba visceral sem cabeça e depenada, contraindo-se no breu. A cidade vai lhe ouvir desesperada, vai acostumar com seu agito. Para a alegria dos meninos, jogarei suas nojeiras do dia pela janela e no fim da tarde brindaremos nossa recém-comuna-hedionda-amorítica. Em agosto podemos nos casar, mandarei estripar um porco em comemoração, você vai jurar por mim e eu vou amarrar você. E ao invés de arremessar arroz na saída da paróquia, vou pedir que joguem em taças o sangue do bicho em seu traje branco. Uma modesta carruagem com dois cavalos caolhos nos levará para a noite de núpcias.

Em sua homenagem, eu mesmo marcarei com ferro em brasa suas iniciais em dois touros espanhóis, que depois serão soltos na avenida mais movimentada da cidade. Em algum semáforo no vermelho, aparecerá um deles, encarando ferozmente a fila de veículos, bufando, espumando pela boca com o sangue prestes a explodir nos olhos. Pense nos arranjos sonoros das buzinas aflitas, os gritos graves e agudos, vidros e ossos quebrando, o ranger do ferro amassando e o povo correndo apavorado, pisoteando os debilitados, escondendo-se da força descomunal da vida. Nossa paixão não terá saída, quando perdermos os sentidos e a insanidade, passamos um cheque sem fundo e vamos nos encontrar em alguma exposição pederasta de Bacon.

Poema para Lourdes

Os músculos rígidos e pesados

"monumento bovino"

saltando e correndo em disparada
estilhaçando vitrines
arrastando em seus chifres afiados um manequim 
um transeunte distraído
peças de roupas
e um saco de lixo cheio de laranjas espremidas

Francis Bacon



domingo, 19 de agosto de 2012

Valeta


Escrevo para não
mas
me
pego
escrevendo como um
vez
outra

se
masco ou
vacilo

é pura
onda

sábado, 4 de agosto de 2012

Espreita


Uma cicatriz te olha pelo espelho
é tarde da noite
e seu rosto já nega o apogeu do tempo
está à procura do que?

No lavatório
as duas torneiras só giram calafrios
e acima
você refletida
em um plano de aflição

Projeção decifrada
sem mascara
um esmo
cada vez mais distante

O rosto ou a cara
a volúpia ou a carne
agora você canta
mas é um chiado triste que ecoa entre os pisos
das suítes
ou dos banheiros

pic. Lucas FL.

Faixa 7

São 12hs
um dos bolsos descosturado
a rua descendo
e algumas ideias não muito fixas

“deflagrado”

o murmurinho naquele morro embaraça
sucessões de cenas e ruídos
sem ações

“o improvável”

dois bombeiros entrando pela janela
e uma senhora
no limite
nos braços
nas veias
no vidro

“eles a salvaram”

sirenes
lagrimas pelo nariz
a vertigem do mata leão
o alheio

Edward Hopper


quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Ele ainda mata o criador


Com alterações nas digitais e a face à base de corticoides, meu personagem não cheira e nem fede. Ele descasca. Almoça em lanchonetes pensando que vive e usa a mesma calça jeans a semana toda. Seu nome é Jean, sujeito intransmissível, mais vivo do que morto, até hoje... Possui uma carteira de identidade, juntou-se com uma mulher mais velha e herdou três enteadas preguiçosas. A coroa decadente foi a única a suportar as escamações de Jean. O tal problema é de cunho psicológico, quanto mais pressionado mais ferido ele fica. 

Semana passada seu suado carro 98' fundiu o motor e a enteada mais nova fugiu de casa. O choro desmedido da conjunge, a falta de coito e o cansaço dos dois empregos levaram Jean a um certo limite emocional, e como era de se esperar, abriram fendas por todo corpo, seu rosto escureceu, e devido à intensa coceira, as virilhas ficaram em carne viva. Teve vergonha de pegar ônibus e as ruas com seu repudio crônico aumentava ainda mais a ansiedade e o desespero do pobre coitado. Quando o encontrei, estava um sol de rachar, ele usava o capuz da blusa e evitou parar para conversar, mas insisti. Comentou que havia encontrado a enteada e que a retificação do motor lhe custou os olhos da cara. Eu não disse nada sobre seu traje, mas sabia que escondia seu drama epidérmico.

Francis Bacon

Redigir


Pode começar por
enquadrar essa janela desossada
reaproveitando o desapercebido

No almoço
pense numa câmera pregada no lugar dos olhos
puxando as calças
e dando tchau para as senhoras

capture figuras dependuradas
sem dentes
sempre sorrindo
pitando
assistindo TV

finja que não vê
e desça o morro
olhando de soslaio

reescrevendo

A arte dos que não sabem pintar

terça-feira, 24 de julho de 2012

Decúbito


Um latente formigamento no antebraço
disseram que era a síndrome do compartimento te usando
expondo toda sua  musculatura
numa aquarela açougue
intensa
e sem nenhuma epiderme ou tecido vivo
pra contar sua história

Devido ao longo tempo que passara inerte
uma crosta disforme 
que mais  parecia cascas de um tronco de cedro velho
obstruíra sua visão

Em suas lembranças mais confusas
havia seu irmão
e não entendia mais nada do velho disco de Célia

Como era de se esperar
você sumiu da cidade
e no último porre
acabou com um de seus braços

Tive pena de você cara
mas nunca vi alguém curar feridas
com salmoura fervente
 
Pollock
















  

terça-feira, 10 de julho de 2012

Interlúdio


I

um camundongo escondido
e o abridor de lata
se enferrujando

II

a boca cheia
exalando 
a conserva preparada pelo ex-retratista

III

a esquina pela neblina

dinheiro trocado

passos

e a cabeça calva

. . .

Notas de um crime

“o bastardo incontrolável”

e os restos na via

Última tendência

camisa de força


pic. Lucas FL.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Boca de chicletes


Estão esquecendo 
que  multi-
disfuncional

tantas
Augustas"

sinônimos
graves”

e as trilhões de janelas ”

de tudo um pouco  
a atmosfera 
capsula 
aparelho de barbear
câmara 
carteiro sem 

e aí
:

pic. Lucas FL.



segunda-feira, 25 de junho de 2012

Ele é bom


Fiquei esperando a luz do dia pelas gretas da janela

esquecia ou esquecido _ pensava

Depois dos cinquenta anos
uma das melhores coisas pra se fazer
é fingir de esquecido

Na cozinha
parti um pão de terça-feira
e acabei escutando os dramas da faxineira

Enquanto ela lamentava sua vida
eu ...

“Naquela manhã
eu queria ser um velho piedoso
para alisar o cabelo ralo daquela empregada com labirintite

fazer ela temer a ciência
e provar sua carência de mulher divorciada na menopausa”

velho asqueroso_ pensava

Depois dessa pequena divagação
meu café derramou sobre a mesa
meu corpo tombou para um lado

Escutei os gritos agudos daquela mulher
e a cadeira ressoando no chão

“calafrio”

Na queda, acabei puxando a toalha de mesa
e tudo veio abaixo

Eu estava torto
frio
e estranho naquela casa vazia

pic. Lucas FL.



domingo, 17 de junho de 2012

A coisa

Se hoje a urina é sintética
será que posso recolocar o osso no lugar
e restaurar a fratura
entre o eu e o fundo?

“não é um milagre estarmos vivos?”

Mesmo tendo em vista
aquele personagem meio absurdo...

acho que não

acho que o melhor é...

melhor mesmo
é pintar uma mão de azul
quebrar uma gaveta
e ir buscar num bar um fardo de homens revoltados,

pois 48 horas

é o suficiente para nos esgotar









quarta-feira, 13 de junho de 2012

Espectros

Zero horas
atendo um telefonema meio lascado
escuto algumas paradas estranhas de fundo
e várias ofensas fiadas:

não somos pagos para isso!

Essas duas figuras
sempre me ligam à cobrar
surgem nas quintas- feiras
cada qual com seu antiquário
exalando um cheiro de ave molhada


Dignos de pena
estão sempre virados
olheiras fundas
vestes puídas
asas encardidas
. . .

Como de costume
sirvo-lhes a janta:

“a comida de anteontem
dormida na mesa
revirada por insetos”

depois de cearem
peço-lhes que vão embora em silêncio

O primeiro a sair é sempre trapaceado pelo segundo

Semana passada mesmo
um deles foi empurrado escada abaixo
os estalos dos ossos rachando nos degraus de ardósia
chegaram acordar a vizinha
que não pôde ver nada

vivem me perguntando se tenho horas

maldito anjos da guarda!


quarta-feira, 6 de junho de 2012

Atropelamento na via rápida

parte 1

Um cara fissurado
meio sequela
meio super
decidiu

girou a roleta
olhou para fora
e na calçada
um bicho desolador o aguardava

Muito das vezes aquele homem não sabia como agir ao manifesto mecânico e sanguíneo
advindo do constante movimento alheio de uma cidade em pura pantomima

No sobe e desce de passageiros
havia calculado
o número de sacolas e de bolsas por pessoa
e o resultado equivalia à 73%
do seu vazio existencial

parte 2

Várias pessoas cercaram o corpo,
e a vítima mantinha firme a mão no bolso

Um garoto abatido perguntou:
_Não desci no ponto certo?
O ônibus se foi?

pic.Lucas FL.

sábado, 26 de maio de 2012

13hs


Toda cidade está asfaltada
aquela rua
não


o homem das pernas trançadas
oscila na via 
em estado de blecaute

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Só para intelectuais


O filho de quatro anos
ao ver a porta do banheiro encostada
chama pelo pai
o velho responde “hum”

O pequeno abre a porta
e depara-se com o pai no vaso
segurando um livro

Daí
surge a pegunta filosófica
“Pai, você está cagando ou lendo?”

terça-feira, 22 de maio de 2012

Na sonoplastia terror/erótico do contrabaixo


Não é vista para a avenida iluminada
e nem para ser vista no mar...

É vista grossa pra parede
paisagem fora do ar
pomar de frutas delinquentes
onde o facão é mera acrobacia no breu

Nesse quarto
existe quatro ângulos:

1º “o rosto revirado”

2º “olhos revestidos de veias pulsantes”

3º “pés lisos em sax-alto”

4º “quadris e coxas em pose pêra cortada”

Da janelas do nono andar
fotos desumanas,
envolventes
de uma menina loira do tipo sereia bêbada
e de um homem-tal-como-sujo

Dos ocorridos
um fruto foi desflorado 
tessitura desmedida
sem prumo
sem pelo
defumado
dócil e cruel como tentáculos

Desfrutes de uma noite em claro
curtições de uma cidade inimiga

Ela foi a primeira das penúltimas
depois
tudo se tornou horror
certa carnificina

De humano e caloroso
só sobrou o mijo quente no piso de porcelanato,
o isqueiro
e os óculos de grau

A arte dos que não sabem pintar.
pic. Lucas FL.

















segunda-feira, 14 de maio de 2012

Armação

pic. Lucas FL.

. . .

pic. Lucas FL.

A fraude Marginal II - O Eu-babuíno


O lado canhoto do peito
onde reside um certo cujo
coberto por osso carne e pelo
vai ser amassado para reciclagem

Nessa manhã
uma cor reverbera nas mãos,
é a sangria escorrendo de uma lata de refrigerante

Escuto o discreto eco das marteladas pela cidade
e dois terços das manobras políticas erradicando sei lá o que

O portão aberto
e um carro de som anuncia:
“Perigo”

_Nas ruas
a senhora Hibridez anda à solta!

Nas manchetes do dia:

"Literata morre de tristeza num motel"

"Em Tiradentes
a tela de projeção "pega fogo",
carbonizando a frágil plateia-cult"

"Professores de arte reivindicam
menos poesia"

"Avó aposentada
acorrenta o vício da neta
no pé da cama"
. . .

Eu crente nesse mundo...
E um movimento-carente estudantil
ao me ver comprar aquele jornal,
grita:

“A culpa é sua”

sexta-feira, 11 de maio de 2012

“Panifesto” da Poesia Urbana contra o eufemismo e a cátedra


Que fique bem claro seu-dotô
a Poesia Urbana é uma praga
que se alastra como favelas
cheira à água de despejo
perturba como insônia
tem a força do tráfico
e o atrevimento dos pivetes do Brás

Não adianta fechar seus vidros elétricos
e viajar para a Glória, a baía, a linha do horizonte
pois a fome das ruas arranhará sua lataria importada
pichará sua parede
incendiará sua vitrine de magazines

Ela anda como os desprovidos
revela sem eufemismo`
as mazelas humanas
a cidade oculta
a tristeza dos chineses
a loucura reprimida dos garis

Se cuida, turista deslumbrado
um arrastão de versos miseráveis
invadirá sua praia
sequestrará seus fetiches literários,
seus continhos fantásticos,
e estraçalhará sua poesia plástica
num tiroteio hediondo

um conselho?
se não quiser perder a pose
corra para bem longe
esconda-se atrás dos muros doces da academia
dope seus jovens operários com boas doses de informação + títulos
e reproduza robôs mais fortes
o suficiente para dar conta do que você não deu

Aqui fora
as crianças ainda continuam praticando papai e mamãe
jovens morrem com a cabeça vazia no volante
existe uma massa de carne e osso dopada de altas doses-institucionais
escolas apodrecem
falta teatro, cinema orgia para o povo

E você catedrático... ah catedrático!!
só preocupado com a chegada de um livro importado
e o congresso no planeta Hermético

pic. Lucas FL.